sábado, 20 de julho de 2019

Cara ou coroa


Outrora fui “o cara”,
hoje sou “o coroa”,
e ser chamado assim
dói mais que atordoa.   

Coroa de que reino
se já em mim falece
o brilho de outros dias
no tempo que anoitece,

e mesmo quem achava
“o tal” aquele cara
hoje lhe vira o rosto  
e até lhe nega a fala?  

De bom grado recuso  
essa falsa nobreza.     
Deixo a outros a glória   
revestida em torpeza.     

Quero livre o meu crânio
– mesmo que só pra vê-lo,  
com a tesoura dos anos,
caírem-lhe os cabelos.


quarta-feira, 10 de julho de 2019

A ciência do viver

Vivendo é que a gente aprende
que não se aprende a viver, 
pois a vida não se mostra  
a quem a quer conhecer.

Viver é se aventurar
nos abismos do instante,
que se sucedem sem regra,
surpreendendo o caminhante.

É não saber se o minuto
anterior à esperança
vai se desfazer em nada
e acabar de vez com a dança.

A única ciência, então,
que a gente tem do viver
é conhecer de antemão
que vai um dia morrer.


Flor e tempo


Sob o luar sereno,
dorme a flor a sonhar
que ninguém vem tirá-la   
do sono em que ela está.

E assim, mais tarde, à luz      
da manhã, vai poder               
colorir o olhar                 
de quem a perceber.  

Quer matizar o campo,
enfeitar o jardim,
nutrindo-se da terra
e adiando o seu fim.

Deixá-la repousar   
inteira, não colhida, 
é como eternizar    
a sua efêmera vida.

Escolha

            A solidão é meu retiro.            Ao burburinho surdo e vão            de tantas falas sem sentido,           prefiro ouv...